quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Falso Poeta


O cara rabisca umas rimas e já dizem que é poeta. Aconteceu comigo.

Pois bem, se o outro, lá, diz que o poeta é um fingidor, fingi que era fingidor. Nunca gostei de poesia. Julgava coisa de fresco, de efeminado. De homem fraco, embusteiro, que enrola, enrola, e não vai ao ponto. Exceção ao Boca, sujeito matuto e matreiro. Não era do tipo nhenhenhém. Lascava o verbo, feito retraço de comprimento certo. Um violeiro sem viola. Um violador dos maus costumes. Dizem que alugava a pena. E não é da praxe de um advogado?

Andei alugando a minha, também. A mim mesmo. Larguei, por aí, uns pastiches, uns radicci com bacon frito. Afinal, não foi o Henry quem profetizou que tudo vale pra baixar umas calcinhas? D'accord. Agora estou velho demais para isso e na última tentativa nem deu lá muito certo. Aliás, o certo, mesmo, é que não deu.

Ó-quêi, eu não precisava ser tão tacanho. Posso aplicar uma demão de verniz, mesmo que o cerne permaneça bruto. Posso entender que a palavra é tinta deitada à tela, irradiando impressões com leveza ou vigor. Posso acatar as idiossincrasias e às polissemias aceder também posso. Abrandar a palavra e lhe dar as nuanças, os matizes cultos. Acarinhar o vernáculo, instigando-o a um mútuo e prazeroso enlevo. Porque há reciprocidade, sim. Na medida em que elevamos o pensamento, a inspiração reverberará luminescentes possibilidades.

O que não posso é tentar me apossar do impossível.


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