terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Verbotrágico Ensaio para Insuflar Bolas Femininas

(escrito numa linguagem ‘acessível’, logo, sem chances de tradução para qualquer idioma)

                 A parada é o seguinte: os filósofos da geral, nada maneiros, mais pra manés, se cheiram com brilhos de quinta. Qualé dessa praia que é vida, se é do bem ou vacilão, ou ateu é o cu que não deu. Acaso se perguntam o porquê dos cabritos cagarem bolinhas de haxixe? Não. Não entendem da bosta, mas defecam nas cabeças. Cês sacaram que são 'os' filósofos? Que quando mulher se atreve, daí já é teoria literária? Pois, é.

                 O teólogo dedura a nota fria. Homem, falsificada estampa do Cara. Outro lasca que mulher tava escondida na ripa. Puta caô, x-9 gaúcho. Vá lá que seja e vem troco. Encheu-se o boi de guampa, condenado a perseguir a vaca. Pior, parido do bucho. O Cara teria inventado o garnisé. Em seguida, baixou-lhe a crista. Virou ovo. Antes que contestem, ovo não tem sexo, só pinto.

                 Se o macho se acha, metendo bronca no mundo, é a mulher quem veio causar. Cheia de curvas. Por vários lados. A dualidade feminina é quem comanda o tráfico no morro das intenções. Dona da vida, faz do homem soldadinho. Na outra ponta, vicia a precariedade. Mulher é corpo que acolhe. É templo ou bordel, deusa ou piranha. Confronto de forças. Ao homem cabe viajar. Na batatinha da escolha. Qualquer que seja, (as)pirará.

sábado, 27 de dezembro de 2008

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Tocata

                 Gérson era viúvo, apesar de uns dez anos a menos que o pai dela. Sócios no escritório de advocacia, encontravam-se, vez por semana, bem cedo. Acertos que não convinham à vista de outros. Talvez por respeito, ou por falta de família, era ele quem vinha. Acostumara-se àquele ritual que bem já se cumpria há uns dois anos.

                 De primeiro, nem ligava. Reunião de velhos. Melhor. Salvava-se um tempo para não ser xereteada nas fugidias entradas à Internet, espiar recados no Orkut, satisfazer o feminil do ego. De uns tempos para cá se alvoroçaria com as suas vindas. Não conseguia entender. Ridículo! Chegara a desenhar os nomes atravessando coração: Gérson e Daniela. Lendo-os, soaram Nélson Mandela. Que tosco! Riscou-os com raiva. Rasgou a folha. Picou-a em pedacinhos tais que nunca fossem mais juntados.

                 Era terça, dia de Gérson vir confabular. Espalhara livros e cadernos por cima da mesa de jantar, pretextando insuficiente a escrivaninha do quarto. Gostava de observar os movimentos daquelas mãos, o jeito com que dava uma batida seca na borda do cinzeiro e depois pousava o cigarro, suavidade e precisão a encaixar no descanso.

                 Numa outra, a mãe a chamara para o café. Teria que se trocar, vestir-se. Forjado descuido, colocaria somente bermudas, a blusa solta, deixando transparecer os seios quando atravessasse a sala. Sentiu um leve arrepio que não saberia distinguir se do frio matinal ou do flagrante.

                 Tijolos e telhas na mochila, a pressa atrasada, o ponto de ônibus se achegando, dissipavam. Encontraria Manú e já tititizariam sobre o garoto do último ano que seguia pouco mais à frente. De volta, subiria, direto, as escadas que davam para o quarto, sequer tomando conhecimento daquilo que rodeava. Mas depois de se gastar em livros e entediar-se com o MSN, apagaria a luz e o pensamento desceria. O pequeno cinzeiro prateado, que acomodava um só cigarro, se avolumava na mente. O cinzeiro de Gérson. Ninguém fumava naquela casa, portanto era dele. Só dele. Somente ele o tocava, o conspurcava com cinzas, o fazia tinir.

                 Ria-se do quanto diziam da feminina malícia. Atraíra, insinuante, as atenções do terceiranista. Ficaram. Quando as carícias escorregariam pelas nádegas, teve asco. Não que não desejasse. A precipitação só lhe fez recuar diante do imediato, do comum. Não se sentia envolvida. Num relance, veria as mãos de Gérson. Sentira-se menos que um cinzeiro. Um depósito de dejetos, abjetas intenções.

                 Cuidava não despertar suspeitas. Alternava a mesa de jantar nos dias e estancava-se no quarto na maior parte das terças. Era quando tirava os fones, se encostava ao marco da porta e fechava os olhos. Odiaria algum passarinho que ousasse piar. Odiaria sua mãe abrindo e fechando gaveta dos talheres. Odiaria o mundo. Tudo, enfim, que pudesse ensurdecer aquela alva mão com pelos castanhos, dedos definidamente másculos, unhas tão bem recortadas, a executar insólita melodia de nota e tempo únicos.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

A Questão Limoeiro

                 Tenho-me por sociopata assumido. Ainda melhor, convicto. Árvores, não alcançaria jamais o clímax daquele roqueiro pederasta trepando com elas. Mas decerto que as prefiro. Desisto de corroborar com vivências psicanalíticas. Guardo tal peculiaridade com deferente egoísmo. Em tons do mais indissimulável sarcasmo.

                 Recém espaçado em nova choupana, me deparei com precariedades. Uma delas, absurda. Inexistiria área de serviço. Tomadas de decisões incumbem reflexão e havia um limoeiro implorando à porta. Esquelético, escroto, instando a estéril. O charlatanismo arquitetônico esboçado vazou-se para o real. Para a tangível dimensão. Direitos à suplicante, enfim, lhes resguardaria complacente telheiro.

                 Nada ou pouco conheço da arte agrícola, mas ouvira dizer sobre meses que não juntem a letra erre aos nomes. Quase no último, instrumentado com serrote, procedi às amputações. Posso resumir, imodesto, que plástica resultada confundiria especialistas.

                 Numa dessas madrugadas mal dormidas, que jogam o sujeito para fora da cama sem direito a sursis, me vi perambulando pelo pátio. Já não ardessem os olhos, ainda os incumbi de vistoria: se for pra foder com o dia, faça-se barba, cabelo et cetera. Juntar gravetinho, pedrinha, desenroscar folha morta encravada em galho, essas coisinhas que remetem a putarias da velhice. Porra, ainda estou esticando a segunda e a falta do maldito ronco já me pedindo terceira!

                 Fora desembaraçando uma dessas tais folhas, que engoliria a vulgaridade do verbo. O raquítico assomara corpo e, copado, resolveu travestir-se. Encheu-se de alegoria. Ofereceu-se, homocrômico. De espinheiro à árvore natalina.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Assim Caminha a Mediocridade

Espelho, Espelho meu
Haveria quem se desse
Ao Crivo do que apetece
Recitar-se em Apogeu?

Acaso não sou Toada
Que encerra com leveza
Ao Bardo alçando a beleza
D'uma Verve amadurada?

Fulgura a Alma italiana
Na Saga shakespeariana
Às Flores de Baudelaire

Instilo ao mais fino Vinho
Bebo-me sem burburinho
Não me Assine um qualquer

...

[Pobre do Pavão
Não voa com Andorinhas
Nem vê seu Garrão]

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Casais

                 A excursão partira pontualmente à meia-noite. Apesar da chuva, os passageiros, boa parte casais, mantinham-se animados. Percurso conhecido, noite mal ou pouco dormida teria compensações num auspicioso café ao imponente hotel. O balanço da suspensão a ar e o acirramento dos pingos minavam resistências. Aos poucos, luzes individuais foram se apagando. Sem mais atenções a dispensar, cruzei cuidadosamente o corredor e me aboletei na cabina.

                 Viegas já se conformara. Teria parceria por, no máximo, uns trezentos quilômetros ou uns cinco cigarros. A boléia era camarim. Lá, me permitia despojar das conveniências de guia e usufruir privilegiada visão, adjudicando-se permissividade: fumar.

                 Rodávamos perto de uma hora e passar uma flanela úmida no pára-brisa que condensava era um mínimo gesto de cordialidade. Enquanto o fazia, não percebi que engatava-se um luzidio trem vermelho. Repentina redução de marcha me trouxe à estrada. Passamos ser mais uma conta daquele imenso colar. Três minutos, cinco... Dez e nada. Acidente. Resolvi olhar os passageiros, transmitir.

                 Ao cabo de meia hora decido colher alguma informação. Uma jaqueta de náilon e um boné improvisariam proteção. Viegas adivinhara. Morte no choque frontal entre dois automóveis. Voltei aos passageiros e amenizei a tragédia. Quase em uma hora a estrada daria os primeiros lentos sinais. Ao lado, cercado por patrulheiros e curiosos, jazia um dos carros.

                 Chegou-se em Piratuba ainda no horário habitual para o café. O esplêndido raiar predispunha dissipar alguma desvirtuada impressão. Ainda pela manhã seguimos para o parque das águas. A tarde aconteceria solta, modorrenta. Curtir o hotel, dormir, conhecer o lugarejo, jogar boliche. À noite, até baile fora descolado.

                 Enquanto observava ou atendia solicitações, me veio imagem da bem-querida. Os casais, em grupos ou mais reservados, estavam bem. Bem-humorados. Alegres e felizes. Quem os visse estimaria as bodas sucedidas. O desastre fora comum. Chuva, imprudência, alguma bebida, talvez. Nunca ouviriam por mim que, no banco de trás do Chevette, esparralhara-se um vestido de noiva.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Leve Um, Pago Nove

                 Maratonista
                 Um passo além das pernas lhe daria a vitória.

                 Ideal
                 Livre. Mas não radical.

                 Previsão
                 Em meio à chuva, um sabiá cantou sol.

                 Tenistas
                 Uma rede de intrigas os separava.

                 Corrida Eletrizante
                 O circuito era curto, daí tantos choques.

                 Autodomínio
                 Conteve o dedo acusador com o polegar.

                 Sílaba Atômica
                 Fu...

                 Vista Plana
                 Ainda acho que a menor distância entre dois pontos é o beijo — gabou-se o chefão.

                 Temperaturas
                 A vingança é um prato que se come frio — meditou o bóia-fria, espiando a gaveta.

                 Nos anais da História...
                 Ainda no século XXI derrubava árvores para limpar-se.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

IIIWW ou Quase

                 Há tempos instalara-se o caos. A home sweet home azedara. Divisões e mais divisões panzer da Alesmânia invadindo pelas soleiras, assinalando visguentos rastros. Soturnas, ao descuido do passo, minando campo. Bem treinados, mas solitários soldados, Grambretaranha espraiara redes de camuflagem pelas orlas do teto. Abatia barões vermelhos e outras cores menos hábeis. Dançando ventres, dragoas-china faziam subir e descer paredes. Casa-da-mãe-Joana, todo um submundo querendo naco.

                 Havia que defender território. Limpar. Convocou-se reunião de gabinete e monitor. Pauta em tela, apertavam-se, entre si, as mesmas teclas. O sinistro da economia calcara déficit. Deterioradas, relações exteriores não alçariam voz. Brado mais alto à saúde: prolongado discurso, vociferou eugenia — a beligerância imputaria preço.

                 Ajuda externa não tardou. Em cena, metaldeídos, piretrinas e piretróides, armas químicas de destruição em rolinhos*. A inhaca do Inhaque, mentira o Imperador, pressionando via tevê. Desviamos esse canal. Tentaria, ainda, panfletar jornal; embrulhamo-lo. Mandou um sabiá-ônu aninhar estratégico limoeiro e, pacíficas intenções, meter bico onde não chamado. De quebra, expôs minhocas, defecando-se, pretenso, em adubo.

                 Armara-se o teatro das operações. Os tanques se empanzinavam com iscas e estouravam. Rechaçado o contingente bretão, sossegou prostituída procissão de lagartixas. Havia ainda que resolver questão do craque das madeiras certificadas reduzindo-se a pó. Mas isto são questões do forro íntimo, políticas bem mais internas.

                 Passada a vassoura do pós-guerra, banhou-se corpo e alma em águas de convicções. Farda-de-gala investida, hora era inverter cenário. Antes presa, já predador, à farra instituída. À civilizada forra. É bárbaro assaltar baladas e estuprar biscates. Arrastá-las para um bem limpinho chalé e celebrar a paz.

*expressão descaradamente chupada ao camarada Zé Alencastro, único e veríssimo alto astral com quem me deparei no trottoir da vida, quando lá nos idos de 1979 se referia ao nosso Inter: “... ataca em massa e se defende em rolinhos".