tag:blogger.com,1999:blog-73934091146091784832024-03-13T07:12:23.258-03:00Itinerário ImprevistoUnknownnoreply@blogger.comBlogger158125tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-29372670622580899122014-12-31T02:03:00.000-02:002020-06-11T20:13:37.290-03:00Itinerário Imprevisto | Revista"... bordai as sedas, sem partir o fio!"<br />
<span style="color: purple; font-size: x-small;"><b> </b><span style="color: black;">Cecília Meireles</span></span><br />
<br />
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://iirevista.wordpress.com/"><img alt="https://iirevista.wordpress.com/" border="0" src="https://1.bp.blogspot.com/-iBs18LXVJYE/XuK40ROelLI/AAAAAAAAEHE/anla2etjMyUkNZxhWR5ViLiAJkRisEJ6gCLcBGAsYHQ/s1600/Imagem_003.jpg" height="307" style="margin-left: auto; margin-right: auto;" title="Itinerário Imprevisto | Revista" width="506" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Layout do novo espaço</td></tr>
</tbody></table>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div><br><br>
Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-42092058071119478932014-12-20T02:48:00.000-02:002014-12-26T07:08:50.162-02:00Negligentemente<p>"A torrente desceu." Confesso que gosto desta frase, escrita há algum tempo. Ela me perfaz sintomático. Quando, enfim, os açoites do calor cessaram com a benfazeja enxurrada, neste sábado, ela desentranhou-se, com ares referenciais. Então percebi que já escrevera tudo o que a tacanha alma de mim quereria.</p>
<p>Estou contido e contenho. A mão fraqueja em sintonia com a corpórea organização.</p>
<p>Raramente manuscrevo. Face à iminente queda de energia, me antecipei. O pó acumulado nos cantos, o lençol amarfanhado e o relógio de parede, que jaz desprestigiado ao rodapé, são bandeiras e signos. Faltam exatos onze dias para rocar as minhas torres num enxadrismo de regras próprias. 2015 é vermelho. Vermelho sobre alvo fundo infinito. Estou apto para a quarta encarnação.</p>
<p>O braço pende e, na extremidade, a caneta se suspende. Negligentemente. Como é horrível e tedioso o som desta palavra. Se ainda o fosse em francês...</p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-16263591671197141532014-12-14T22:20:00.001-02:002014-12-14T22:35:24.495-02:00Aquarela<a href="http://1.bp.blogspot.com/-ofvZISdS0J8/VI4smAHiDdI/AAAAAAAAA20/y0ZSMfrqN34/s1600/recorte.jpg" imageanchor="1" ><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-ofvZISdS0J8/VI4smAHiDdI/AAAAAAAAA20/y0ZSMfrqN34/s320/recorte.jpg" /></a><br><br>
<p>A aldeia está pálida. A bananeira acena um desvalido verde-ouro. O chuchu adicionou mais pegadas à laje. Vinte e cinco tons de cinza recobrem monocromáticos leitos de barro. Um cachorro em P&B irrompe com o que sobrou da ferrugem dos elos. Os pigmentos do céu repousam no fundo da lata. A conspiração in-sol-vento não revolve nem solve.</p><p>É domingo. Faltou cor. Faltou gente.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-88564914154485539382014-12-11T11:19:00.000-02:002020-04-01T02:10:51.196-03:00Pingo<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://1.bp.blogspot.com/-Rc3thPbXbPY/XoQiBgC6cbI/AAAAAAAAD-U/1KJH9hhZ-UwOBL0fjW9s_ZuL5N5FYrNwACLcBGAsYHQ/s1600/agua-escura.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="423" data-original-width="626" height="216" src="https://1.bp.blogspot.com/-Rc3thPbXbPY/XoQiBgC6cbI/AAAAAAAAD-U/1KJH9hhZ-UwOBL0fjW9s_ZuL5N5FYrNwACLcBGAsYHQ/s320/agua-escura.jpg" width="320" /></a></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<i>Sunt lacrimae rerum</i>,<br />
<i>et mentem mortalia tangunt</i><br />
Virgílio, Eneida<br />
<br />
Pingo<br />
Que do espaço aflui e se lança<br />
Gravitacional<br />
<br />
Se espatifará<br />
Bombardeará a formiga<br />
Fará germinar<br />
<br />
Esgueirar-se-á por goteiras<br />
Formará córregos, rios<br />
Em fugas ao mar<br />
<br />
O mar<br />
A eternidade<br />
Ciclo e século<br />
<br />
Olhai e refleti<br />
Poetas do absinto e do abstrato<br />
Se vos encantam céus<br />
Ou passionalidades telúricas<br />
<br />
O sangue, o sêmen<br />
O sumo<br />
<br />
O absurdo desiderato<br />
O mais profundo<br />
Werther em lágrimas<br />
<br />
São teus espectros<br />
Em alternâncias de estado<br />
Sendo sempre<br />
E tão somente<br />
Pingo<br />
<br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-89869613115678077272014-12-02T10:11:00.000-02:002014-12-03T10:13:47.114-02:00Adiós, Chespirito<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://1.bp.blogspot.com/-GzIBuhuNhG8/VH79qH2E1pI/AAAAAAAAA0Y/7aW6Jbv2cXs/s1600/Chespirito.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-GzIBuhuNhG8/VH79qH2E1pI/AAAAAAAAA0Y/7aW6Jbv2cXs/s320/Chespirito.jpg" /></a></div>
<p>Quando morre um palhaço, penso logo nas crianças. Inclusive naquela que fui e que me permito ainda cultivar. É uma tristeza indizível, uma sensação de perda que transcende à racionalidade. É como se nos roubassem mais um tanto da magia e do encantamento, tão já precários nesse confronto absurdo que chamamos de realidade.</p>
<p>Adeus, Roberto Gómez Bolaños. Obrigado por ter existido.</p><br><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-14168094069701261022014-10-04T14:06:00.000-03:002014-10-04T14:06:01.666-03:00Le(ndo)minskiLendo Leminski<br>
Às sete da manhã<br>
A luz da rua<br>
A lua do amanhã<br><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-40789436434786243982014-08-25T01:47:00.000-03:002017-11-05T03:01:57.956-02:00Legado<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-e4wHLA-RFTk/U_3rjrrRhGI/AAAAAAAAAis/8Sy_uIkcIeo/s1600/e2.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://1.bp.blogspot.com/-e4wHLA-RFTk/U_3rjrrRhGI/AAAAAAAAAis/8Sy_uIkcIeo/s320/e2.jpg" /></a></div>
<br />
Por que tanto cuidado, meu bem?<br />
Palavras escolhidas, a não contradição<br />
É isso que se aprende na escola da traição?<br />
Ou na porra da faculdade do vade-mete e mecum-vem<br />
<br />
Ah, não me venhas com o ato perfeito<br />
A vazia denúncia, a procrastinada intenção<br />
Ou com as tuas tautologias de segunda e terceira mão<br />
As minhas cabeças merecem um pouco mais de respeito<br />
<br />
Mas não temas expor teu casto corpo ao delito<br />
Nessa refrega é que estarei mais bem presente<br />
No rábeas córpus em que já me pronunciei indecente<br />
São teus ouvidos o eterno fórum dos meus gritos<br />
<br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-70873699695755995702014-08-22T01:31:00.000-03:002014-10-24T04:05:54.167-02:00Ritmo, Amores e Velocidade<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://1.bp.blogspot.com/-jIx-fNB6i8k/VA6lt7l0hxI/AAAAAAAAAqA/VXedLh-7gxc/s1600/luz_farois.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-jIx-fNB6i8k/VA6lt7l0hxI/AAAAAAAAAqA/VXedLh-7gxc/s400/luz_farois.jpg" /></a></div><br />
<p>Se tem uma coisa que não combina comigo é a tal da ataraxia. Já nasci agitado, com o pé embaixo e o pinto em posição de tiro.</p>
<p>Sou roqueiro, mas gosto da vibração de outros gêneros que contenham um arranjo carregado no baixo e na bateria. Quero, é mesmo, ver o papelão do alto-falante estrebuchar, estourar.</p>
<p>A energia do ritmo é adrenalinamente alucinógena. Sinto o sangue correr mais rápido, zoar dentro das artérias. Preciso sentir a música com o corpo inteiro. Como se reverberasse e voltasse pelos poros, formando uma espécie de espírito exterior. Esta aura então me comanda, me inspira, se apodera das volições. A começar pelo pé, acalcanhando a batida. Dançar, então, é o sacramento da comunhão.</p>
<p>Não posso dizer se amei. Ao menos, acreditei que sim. Desde que houvesse paixão. Não digo desse foguinho de palha, comum, que não cozinha. Tem que ser daqueles que fazem a pressão da panela explodir. Não fosse <i>full-time</i>, não o seria, também.</p>
<p>Vivi todos os quereres engasgando com o coração, com tijolos gelados no estômago. Do tipo em que se atende o telefone e se sente – sempre! – um choque, uma eletricidade eufórica. Isso, com o celular, nem tem mais a mesma graça. Metade da emoção vai embora com o reconhecimento da chamada.</p>
<p>Mas é na estrada que enfio, de vez, o pé na jaca. Não curto partidas nem chegadas. É o meio, esse intenso meio, que me fascina. Com curvas, melhor ainda. Não sou porra-louca, conheço os limites. E me excita tangenciá-los. No desenho da pista, no dial do rádio e nas coxas que vão no banco do carona.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-58056551100506931842014-08-21T01:19:00.000-03:002014-09-30T06:55:58.100-03:00Uma Historinha<div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><a href="https://lh4.googleusercontent.com/-TJgYg8UckVU/VCp9EerKgFI/AAAAAAAAAwE/lY9pFgwBj7s/s400-no/blueangel.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="300" width="300" src="https://lh4.googleusercontent.com/-TJgYg8UckVU/VCp9EerKgFI/AAAAAAAAAwE/lY9pFgwBj7s/s400-no/blueangel.jpg" /></a></div><br />
<p>– Posso te dar um pouco de carinho?</p>
<p>Tentei abrir os olhos, mas estavam febris, remelentos. A zonzeira da maldormida noite me acossava. Corpo moído, doído, insisti em fixar.</p>
<p>– Como assim, quem é você?</p>
<p>A visão morava fora da realidade, uma completa descontextualização. Agradável, entretanto. Tinha dois olhinhos azuis, pequenos, mas de inquietante vivacidade. Os cabelos não loiros, amarelos, contrastavam lisamente com a redondez das bochechas. A boca, miúda, mantinha o sorriso serelepe. Os bracinhos, as mãozinhas, tudo aspectava a uma bonequinha de biscuit. E estava ali, descalça e envelopada num vestido leve, muito azul, sentada ao pé da cama.</p>
<p>– Perguntei se posso te dar um pouco de carinho... Posso?</p>
<p>Tentei saltar, mas foi inútil. As amarras da prostração não cederam. Derribado, só fiz balbuciar um "anrã", um aquiescente e depauperado "anrã". A cabeça afundou no travesseiro, que fervia. Senti a fragrância suave exalando da mão que se aproximava. Tocou-me os cabelos e os acariciou, com uma leveza inimaginável para aquela mão. Sedado pelo mimo, adormeci.</p>
<p>O rascar do trilho da cortina violentou meu sono. O sacerdote viera ministrar a extrema. Fitou-me, algo perplexo, algo atemorizado. Estaria diante de um milagre ou do próprio demônio?</p>
<p>Espantos dissipados, tratei de forrar o bucho, que há muito já não se ocupava. Enquanto corria o repasto, perguntei aos de casa sobre a insólita visita. Entreolharam-se, pantomimas reticentes, exclamativas.</p>
<p>– Guria? – indagaram, em uníssono.</p>
<p>– Sei lá, acho que delirei. A febre...</p>
<p>Portões cadeados, câmeras, a gentarada, tudo conspirava em desfavor. Acabei por desistir.</p>
<p>À noite, o noticiário destacaria a trágica queda de uma garota, que despencara da cobertura, na festa dos seus quinze anos. As imagens restringiram o foco a um desencontrado par de sandálias de salto.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-78613515867952888802014-08-20T01:06:00.000-03:002015-01-01T13:49:31.124-02:00Falso Poeta<div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><a href="https://lh3.googleusercontent.com/-RVMn6xNvHrU/VCp3Gdupm4I/AAAAAAAAAvY/x1hTrHzbasU/w328-h479-no/frontispic%C3%ADo1775.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="359" width="246" src="https://lh3.googleusercontent.com/-RVMn6xNvHrU/VCp3Gdupm4I/AAAAAAAAAvY/x1hTrHzbasU/w328-h479-no/frontispic%C3%ADo1775.jpg" /></a></div><br>
<p>O cara rabisca umas rimas e já dizem que é poeta. Aconteceu comigo.</p>
<p>Pois bem, se o outro, lá, diz que o poeta é um fingidor, fingi que era fingidor. Nunca gostei de poesia. Julgava coisa de fresco, de efeminado. De homem fraco, embusteiro, que enrola, enrola, e não vai ao ponto. Exceção ao Boca, sujeito matuto e matreiro. Não era do tipo nhenhenhém. Lascava o verbo, feito retraço de comprimento certo. Um violeiro sem viola. Um violador dos maus costumes. Dizem que alugava a pena. E não é da praxe de um advogado?</p>
<p>Andei alugando a minha, também. A mim mesmo. Larguei, por aí, uns pastiches, uns <i>radicci</i> com <i>bacon</i> frito. Afinal, não foi o Henry quem profetizou que tudo vale pra baixar umas calcinhas? <i>D'accord</i>. Agora estou velho demais para isso e na última tentativa nem deu lá muito certo. Aliás, o certo, mesmo, é que não deu.</p>
<p>Ó-quêi, eu não precisava ser tão tacanho. Posso aplicar uma demão de verniz, mesmo que o cerne permaneça bruto. Posso entender que a palavra é tinta deitada à tela, irradiando impressões com leveza ou vigor. Posso acatar as idiossincrasias e às polissemias aceder também posso. Abrandar a palavra e lhe dar as nuanças, os matizes cultos. Acarinhar o vernáculo, instigando-o a um mútuo e prazeroso enlevo. Porque há reciprocidade, sim. Na medida em que elevamos o pensamento, a inspiração reverberará luminescentes possibilidades.</p>
<p>O que não posso é tentar me apossar do impossível.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-55642260236498308482014-08-19T00:23:00.000-03:002015-08-23T04:42:56.772-03:00Lili Marley e Jarbas Alonso<p>Meu nome não é Alonso nem o dela Marley. Mas fomos. E deste fomos sucede o que somos.</p>
<p>Ela me ensinou a borboletear e eu a ela acrescentar pimentão à sopa. Foi tenso, faltou bom-senso, mas rolou intenso.</p>
<p>Poderia contar detalhes, mas pra quê? Pra vocês morrerem de inveja e botarem um olho com peso de boi de abate? Ah, vão comer um pastel de abacate! Ou seria de alface?</p>
<p>Foi assim, numa marrecada, casa de dignos amigos caçadores, com marrecos capturados no mercado público. Eu chambão, ela voando as tranças. Aliás, a trança, arrebatadora trança.</p>
<p>Pirei. Pirei na batatinha. Viajei no purê. Ela dura na queda, caidaço eu. Jogado aos seus pezinhos 36.</p>
<p>Não houve beijo. Espera, deixa eu contar! Se é que existe palavra neste mundo pra dizer. Porque não foi deste mundo. Não, não foi mesmo. Uma conexão metafísica, talvez. Almas se beijam? Tá, vou deixar a frescura de lado. Abandonamos o medo, a incerteza, a expectativa e nos completamos. Fluidamente ionizados. Eletrostaticamente inversos. Agora piorou. Foi péssimo, isso. Sucumbe quem o inefável tenta decifrar.</p>
<p>Sei que ela está me lendo. Lendo e rindo. Até se mijar. Não há pudores na liberdade de amar.</p>
<p>Mas o que se pode esperar de duas cabeças-de-vento? A geminiana e o aquariano... Apetites satisfeitos na incensurável gula e um vendaval.</p>
<p>As pessoas adoram causar. Causávamos para nós mesmos. Exceto aquela vez que a tua minissaia calou quatrocentos talheres masculinos na churrascaria. A perplexidade dos comuns esbarra nas coxas, mas desconhece a sutileza da sapatilha.</p>
<p>Estrambótico tenha sido namorar às sete da manhã, ouvindo o pagode daquele bitata à beira do rio. Louco, sim, por querer assim. E por assim querer, guardo, inolvidável, a leveza encantadora dos teus fios de seda cintilados à luz de quem te dá nome.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-75609924498070676092014-08-18T00:12:00.000-03:002015-08-23T04:42:29.506-03:00À Minha Primeira Namorada<p>Esta, apesar de ridícula, não é de amor uma carta.</p>
<p>Sabe, M., há coisas na vida que escapam da compreensão. Por mais que tenhamos certeza de possuir todas as peças, não há solução para o encaixe. Dois anos antes de te conhecer, matei aula para me inscrever no exame de seleção, lá no Julinho. Junto com alguns colegas, eles formalizariam, não eu. Fui na base da folia, sem nada. Depois, corri atrás. O que suscita é que passei, não eles.<br />
<p>Cooptaram-me, ano final, a secretário da agremiação estudantil. Supersônica carreira, alcei voo à presidência. Havia, então, que reunir-me com os líderes. O tumulto já se calculava, pois a casa andara fora do arrumo por tempos. Não bastasse a tremura pelo enfrentamento, havia dois olhos acesos, fixos, diretos. Desorientadores. Paradoxalmente, aquiescentes. Desejei que a ladainha terminasse de uma vez. Eu sei, M., a natureza privilegiou a alma feminina, desnecessário tripudiar: é claro que tu serias a última a sair!</p>
<p>A casualidade proporcionou os encontros. Será? Bem, se ela não desse conta do recado, o meu pescoço o faria. E te cerquei, te encurralei contra a parede para roubar o primeiro beijo. Lembras? Fugiste. Mãos dadas, às escondidas, tão e só. Nunca rolou o beijo. Estranho namoro estranho.</p>
<p>Um dia, o último antes das férias, só disse: – "Lá vem o meu. Tchau!". Embarquei e sumi.</p>
<p>Nunca entendeste. Nem eu. Mas a deusa dos mal-resolvidos casos se interpõe e instiga. Visitei o cliente e me deparei contigo. Constrangido, tive que te encarar. Perplexo, ao te saber noiva e, apesar de, a confissão: o diário que só continha jota, jota, jota...</p>
<p>Ou, daquela vez, em que levo meu pai àquele bairro e paramos justamente em frente a tua casa! Como não sucumbir?</p>
<p>A festa de empresa no clube onde ministrávamos curso foi o viés mais mefistofélico – e essa palavra é parte do teu legado – dessa deusa, que insiste em se ocultar sob os véus do casual. Aproveitei o intervalo e, irrefreável, desci. Dançamos. Entre sombras e luminescências, no palco do irreal, vez primeira acolho teu peito no meu. Na saída, o táxi. Chovia, lembras? Roçamos os lábios e senti mais que pingos a me umectar a face.</p>
<p>Absorto, os mosaicos da Rua da Praia se fundiam com a desordem das ideias. "Pensando na vida?" Assaltado pela mão que segurava o braço, me rendi. Como resistir, M.? Quase uma dezena de anos e a mesma incandescência a me perscrutar. O composto precipitado de casamentos caóticos emanaria comburente.</p>
<p>Confrangidas esperas em furtivas manhãs de sábado, o fetiche da boina donde escorriam os reflexos dos cabelos e o jogo de esquivas e tergiversações se incumbiriam da derrocada. M., tu só querias viver um sonho, lembras? Sem culpas. Ao amparo da mais sagaz hermenêutica. Enfim, os lábios que antes só esgrimiam intermináveis colóquios, baixaram a guarda.</p>
<p>Três dias, três semanas, três meses? Não sei, M., foi tão etéreo, tão atemporal...</p>
<p>Repiso o exórdio, as primícias. Não de amor é uma carta. Por inexata, premissa também não é. Talvez só o cenário para exercitar o monólogo shakespeariano, com alquebrada indagação: por que nunca brigamos?</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-91290828706286802142014-08-16T23:07:00.000-03:002016-06-01T06:15:58.915-03:00Requesta<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-nLk49gRgnjw/VAIFMJAxr8I/AAAAAAAAAjE/D4uq_i3yB4g/s1600/antero_de_alda_poema_guarda_chuva_fechado.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://4.bp.blogspot.com/-nLk49gRgnjw/VAIFMJAxr8I/AAAAAAAAAjE/D4uq_i3yB4g/s320/antero_de_alda_poema_guarda_chuva_fechado.jpg" /></a></div><center><span style="font-size: xx-small;">Poema do guarda-chuva fechado - </span><i><span style="font-size: xx-small;">Antero de Alda</span></i></center>
<p>Imperceptível filete escorria. Formava uma vírgula, saindo da fresta em direção ao corredor.</p>
<p>A ante-sala recendia a etilato consubstanciado numa fragrância qualquer. Pinho, lavanda, alfazema? Pouco importa, a não ser pelos signos que se refletem na atilada análise. O piso branco era de grandes placas de porcelanato. Logo percebo a ostentação à base de mesquinhez: economizara na mão-de-obra. Por baixo do sofanete de napa lilás, uma tomada debruçava pela abertura sem espelho – oculta desídia. As cortinas sintéticas, ordinariamente brancas, deixavam passar a claridade matutinal, desbotando avizinhadas telhas francesas. Evidentemente que investir numa paisagem marinha implicaria numa inversão mal-sucedida. O inquietante – abstruso, até – era o carmim do bandô. No mais, vogava a frieza dos arquétipos comuns a este negócio, completa pela insipidez da recepcionista. Os fios do telefone, do noutebuque, se emaranhavam contorcidos e imiscuídos por entre as pernas da moça, e tudo parecia um cipoal, de tão delgado era seu corpo. Das paredes, de um mesmo irritativo branco, solitário quadro pendia, réplica embutida em negra moldura. Compreendi, imediatamente, a procedência do noutebuque, que dependia do fio. "Elementar, meu caro." Tão primário raciocínio, como o sucedido: leva-o consigo para se organizar.</p>
<p>– O senhor tem hora marcada?</p>
<p>Engoli a saliva, acidulada pela nicotina e pelo agastamento. Era o átimo <i>quantum satis</i> a evitar uma grosseria. Sou lá homem de horas marcadas? O que tenho que ser, na hora precisa, sou e basta. Sem hora nem mora.</p>
<p>Voltei a sentir o hálito acidificado e, revendo, não fora a nicotina, mas o café. Péssimo café, destas misturas que levam na torra o milho ou o amendoim para abaixar o preço. Sentindo a apreensão da peniqueira, monossilabei afirmativo. Burocraticamente, ela enfiou seus dedos esborrachados, quase ausentes de unhas, nas teclas. Pronunciou meu nome, instando confirmação. Desta vez só assenti, condescendente menear.</p>
<p>– O senhor pode sentar, que já vou anunciá-lo.</p>
<p>De cor, a frase descorada. Ri, por dentro, rememorando Nikita obrigada a esticar a pata para ganhar seu biscoito. E, é claro que não sentei. Ainda não terminara a inspeção. Um guarda-chuva de doze varetas me espreitava por detrás da porta principal. Antes que fosse pilhado em flagrante, concentrei meu olhar na outra, que depois de uns cinco ou seis minutos se abriu. Cadela! Demorara propositalmente para marcar posição, impor domínio.</p>
<p>– O senhor pode passar...</p>
<p>A mão na tua bunda? O cartão do descrédito? Ironias e malcriadezes não faltariam. Só no imaginário, obviamente.</p>
<p>– Olá, como você está? – e estendeu a mão.</p>
<p>– Estou bem – respondi sem corresponder, a minha no bolso.</p>
<p>Olhei atentamente a mão. O esmalte provocaria ilações: então, agora adornava a garra? Luxinhos e vaidades que lhe permitiam o crapulear do ofício. Já tomara aquela mão na minha, esmaecido tempo. Mas o guarda-chuva nada feminil gritava. Onde teria andado aquela mão, naquela manhã? O asco me arrepiou.</p>
<p>– Certo, sem circunlóquios, então. Pensou na proposta?</p>
<p>Gostava ela do rebuscamento vocabular, das inferências imediatas, das figuras e firulas do jargão. Expressava-os com leveza, mas indisfarçável gáudio. O asco, o ácido, o destempero me vinham agora em profusão. Respirei, o quão fundo consentia enfisematoso fôlego. Não lhe daria o prazer da descompostura.</p>
<p>– Acordo? – sorri, de canto (e o fiz exatamente por saber que aquilo a desestabilizaria). Quais as garantias?</p>
<p>– Tudo homologado perante o juízo.</p>
<p>– Isto não garante absolutamente nada... Pare com estes embustes!</p>
<p>– Seja razoável...</p>
<p>– Sou. Lembra?</p>
<p>– Não misture as coisas...</p>
<p>– Minha cara, lamento se você ainda não aprendeu. As coisas vêm e vão misturadas. Consuetudinariamente misturadas.</p>
<p>As pupilas se dilataram, a íris tonalizou mais acastanhada. Os lábios se apertaram, denotando a contrafação. Odiou a contrariedade. Que artimanha poderia ainda sustentar em seu libelo? Por certo havia cercado todas as possibilidades; não lhe escaparia um só lance, e para todos se preparara. Apertou o pino da Montblanc como se aperta o detonador da carga de explosivos. O sobranceiro cheque-mate se vomitaria por iminente.</p>
<p>– Então não há outro caminho.</p>
<p>Desta vez não timbrou com reticências. O perfeito esgar das suas perfeitas construções lógicas. Ali se resumia toda a sua natureza, todos os seus vieses, todo um castelo de pedras umectadas, visguentas, escorregadias. A fortaleza, com inexpugnáveis muralhas, cingida por profundo fosso habitado por admirável coleção de reptilianas criaturas e um outro tanto de sub-reptícias volições.</p>
<p>– Mero sofisma do acidente.</p>
<p>Os lilases e carmins se refletiram na sua tez. Sabia que não haveria ganho ou vantagem. Que digladiava além das arenas legais. Que obstaculizara pela simples desconstrução. O mutismo inundou. Dei as costas e preferi a escada ao elevador. Cada degrau dos sete andares reverberando um taque-taque inconexo, dislógico.</p>
<p>Rua afora, o burburinho obliteraria o acídulo recalque de lábios que nunca se tocaram.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-61196365920761339072014-07-31T18:09:00.000-03:002014-09-29T04:35:35.339-03:00No Dia do Meu Funeral<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-8nK8ElcS9QA/U_3bHj65d7I/AAAAAAAAAiU/C5S37AwpTlA/s1600/pompa.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://2.bp.blogspot.com/-8nK8ElcS9QA/U_3bHj65d7I/AAAAAAAAAiU/C5S37AwpTlA/s1600/pompa.jpg" /></a></div>
<p>Morri de agosto. É, o plantonista do SAMU atestou infarto agudo do miocárdio. Que cárdio? Que mio? Então <i>tuo cardio</i> fodeu com <i>mio</i>? Dá vontade de ressuscitar só pra dar uma aula prática sobre <i>plurima mortis imago</i>.</p><p>A praxe correu. Os papa-defuntos despejaram a massa ebórea no fundo fétido do rabecão. Depois, calça de linho, <i>black blazer</i> e uma gravata na camisa não estreada. Porra, mas esses caras ainda não aprenderam a dar um nó? Sabe aquela proverbial do burel e do monge? Pois, é. Não faz, mesmo. A gravata não é um adereço, um acessório. A gravata é um ritual. É a asa colorida do macho que vai conquistar a fêmea. É a expressão mais íntima dos estados da alma, quando eleita a estampa. Tem que ser discreta, mas distinta. Que a lâmina maior não trisque a fivela, mas se aproxime o quanto puder. A menor, oculta. Decentemente oculta. Não menos do que dois terços do comprimento da outra. Quando o movimento a exibir, saber-se-á metade da personalidade de quem a use. O ápice é o nó. Este tem que ser perfeito. Corrediço, que desfaça sem enredo. Suavemente finalizado e firme. Absolutamente na mesma linha do colarinho e sem folga. O nó é o coração da gravata. Nunca peça ajuda a uma mulher – o ato de se engravatar é exclusivamente masculino. As mulheres reconhecem sinais. Não confesse inabilidade.</p>
<p>O tempo passou para você? Pra mim, não! Daqui vejo tudo em <i>real-time</i>, modo acelerado. O precário esquife me acolheu. Aliás, não a mim – aos restos. Estou aqui. Ou ali. Igual câmera indiscreta de supermercado. Melhor, eu estava aqui. Agora, ali, na capela mortuária. Cercado de corvos, urubus, andorinhas e gaviões. Pombas-rolas e rolas nas pombas. As flores – ah, execráveis flores... O odor dos pavios ensebados, misturado ao das pétalas que degeneram. É nesta hora que gostaria de ter vivido circuncidado. Flor é bom pra se ter no jardim, presa ao pé, vivinha. Não, isto não foi um ato falho, uma irresignabilidade. Pode parecer irônico, mas foi reflexo.</p>
<p>Gosto de velórios. Sinto um metafísico <i>frisson</i>. Velório é um evento, uma farra. Tem o grupo das piadas. Do alheio viés, o outro. Penso na incongruência de não festejarem sonoramente o desencarnado. Cadê o meu Led? Quem sabe, um Sepultura... De quebra, Tristania. Não, não sou gótico, mas fissurado naquela vocalista. Pôu, já ouviram Deadlands? Deviam combinar: uns trazem o som, os demais a bebida, o orégano cor-de-rosa, o Pure Hemp. Pra mim, um johnniewalkinho. Posso até dar uns pegas, mas duvido que a viagem seja mais maluca do que este pó ao pó.</p>
<p>Um franciscano, catado de improviso, encomendou. Não lhe revelaram ser incovicto o defunto. Murmúrios. Bulício. Na alcova dos cava-covas, os cossacos do ofício (te vejo por, aí, “Lem”).</p>
<p>Veio, então, a tampa. Lamentei o nó.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-8318369440539297542014-07-28T01:41:00.000-03:002014-08-27T01:41:16.401-03:00Um Passarinho me ContouO pássaro pousou na laje<br />
Atrevido, me fitou<br />
E disse: "Nada é eterno".<br />
<br />
Ora,<br />
Vá contar suas lorotas<br />
Para outro<br />
Seu sabiá enxerido!<br />
<br />
Decolou,<br />
Adejando ao Horizonte<br />
Sabendo-se seguido.<br />
<br />
Lá pras bandas de Judas e suas botas<br />
Piou seu ultraje:<br />
"Fica aí com teu Inferno!"<br />
<br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-2178749708374157502014-03-01T17:28:00.000-03:002014-08-26T17:30:37.284-03:00MetabolismoEntão<br />
Se a poesia<br />
É o alimento da alma<br />
Vá com calma<br />
<br />
Mastigue<br />
Com todos os dentes<br />
Cada segundo do dia<br />
Cada letra do alfabeto<br />
<br />
Pois tudo se separa<br />
Realidade e fantasia<br />
O nutriente do dejeto<br />
<br />
Um corpo afoito à boca<br />
Esvai a alma no reto<br />
<br />Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-35607491534037781762014-02-25T17:24:00.000-03:002014-08-26T17:26:28.302-03:00Corpo de Delito
Desfeito o mito<br />
Do pirulito<br />
Resta o palito<br />
<br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-45516756117738889942013-12-14T00:32:00.000-02:002015-01-01T14:00:33.827-02:00Moeda Forte<a href="http://3.bp.blogspot.com/-jc-FPzPucyc/VKVvA04GBaI/AAAAAAAAA5k/sbPkHxbCNbw/s1600/brizoleta11.jpg" imageanchor="1" ><img border="0" src="http://3.bp.blogspot.com/-jc-FPzPucyc/VKVvA04GBaI/AAAAAAAAA5k/sbPkHxbCNbw/s400/brizoleta11.jpg" /></a><br><br>
<p>Há pouco, um japa criou a Bitcoin – moeda virtual que circula na Internet. Para se ter ideia da sua cotação, por trezentas bitcoins é possível comprar um Porsche.</p>
<p>Legal! – pensei. Assomado pelo cetegístico bairrismo, sentimento único que só os nativos deste apêndice geográfico se permitem possuir, logo imaginei o Tchê.</p>
<p>É estarrecedor que nós, gaudérios aguerridos, especialistas em transviar a História ao ponto de elevar o bandoleirismo à saga, não tenhamos pensado nisso antes.</p>
<p>Tudo no Sul é forte. O homem é forte, o cavalo é forte, a bebida é forte. Até o tranco da morena Rosa é forte. Portanto, o Tchê já nasceria, circunstancialmente, forte.</p>
<p>Ao forte, logo me advém o durável. Em qual substrato se estampariam as nossas cédulas? O papel-moeda dos De La Rue é caro e feito por gringos – execrável. A celulose produzida por aqui está comprometida. Ora se presta a coador de café (e café é coisa de paulista), ora a papel higiênico (algum até perfumado...). Mas, que tal o couro? Perfeito! O couro é produto legítimo, onusto de tradição, durável, flexível e pode ser marcado a ferro. Nada mais justo do que guaiacas e bombachas pilchadas de couro. De quebra, se sequestraria um significado e, quando o vivente perdesse até a mulher no jogo do osso, se poderia dizer: "Não dá mais no couro!".</p>
<p>Há, ainda, que se definir as frações pecuniárias. Os ditos centésimos, cunhados em metal varonil – porque o dos outros é que é vil. O ouro já foi todo contrabandeado para o Uruguai, a prata homenagearia os nossos desafetos castelhanos e o cobre azinhavra os chilenos. Há que se meter o ferro, mesmo! E a cunhagem? A efígie dos notáveis albergaria polêmicas quanto a valorações de chimanguistas e maragatícios. Penso numa solução pacífica: ferraduras. Sim, destas que protegem os cascos das cavalgaduras. O número de furos por onde passam os cravos de fixação determinaria o valor. Moderno, prático e eficiente. Didático, diria, até. Servir-se-iam delas os mestres, tomando-as como ábacos no desvelar da iniciação aritmética. Contemplados estariam, também, aqueles de curta ou nenhuma visão e que se aprimoram no apalpo. Magnífico! Ouso repetir: perfeito! É bem verdade que ainda falta batizar tais ferrinhos. No terreno fértil do meu pensamento, enriquecido pelo fosfato e pelo nitrogênio, germina formosa planta, galhada por ramificações associativas. Na folha mais alta, mais tenra e mais viçosa, me ocorre a fotossíntese desta gênese: o designativo cascal. Sim, cascal, numa suposta alusão àquilo que se refere aos cascos. Eis a cunha e a alcunha!</p>
<p>Haveria algo de mais lídimo, dentre os valores gauchescos, do que a gadificação e o cavalarianismo do meio circulante?</p>
<p>Outro fator que urge criar moeda própria: há muito que transcende uma inquietação separatista, daquelas do tipo "os incomodados que se retirem". A República dos Pampas está por um fio de arame farpado a ser esticado na altura das barrigas verdes. Vai que acontece... Nada a preocupar. Rápido como um tiro de laço, uns poucos paus e costaneiras de eucalipto erigiriam a Casa da Moeda pampiana. Por uma ponta é matadouro. Na outra, é já nascedouro – berço do novo dinheiro.</p>
<p>Mas há que se ter consciência monetária. As grandes potências substituíram o lastro em ouro pela credibilidade. Aos incrédulos e pessimistas asseguro: é possível duvidar das garantias oferecidas por um fio de bigode?</p>
<p>Nos finalmentes, teríamos a questão da representação simbólica dessa moeda. Penso logo num pragmático T, sucedido por um cifrão. E antes que me assomem vírgulas homoafetivas ou xenofobias pontuais, dou de talho, ao melhor estilo democrático sulista: é dois pontos e fim! Ah, não me digam que não fica fofo um T$ 1:00 na telinha do aipode?</p>
<p>Mas nada de Porsches, Lamborghinis ou Camaros amarelos. Por aqui, bem equiparado, se venderia um belo touro reprodutor, daqueles disputados a três listras em remate bagual, por uns míseros quatro tchês e vinte cascais.</p>
<p>Eita moeda forte! E da boa...</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-63030530059115227122013-11-11T14:52:00.000-02:002014-12-28T03:48:47.288-02:00As Minhas Musas<a href="http://2.bp.blogspot.com/-J4oL7xs2FHU/VJ-ZodVE1XI/AAAAAAAAA4g/gtqT8HKXqGE/s1600/08.JPG" imageanchor="1" ><img border="0" src="http://2.bp.blogspot.com/-J4oL7xs2FHU/VJ-ZodVE1XI/AAAAAAAAA4g/gtqT8HKXqGE/s320/08.JPG" /></a><br><br>
As minhas musas são brancas<br />
Pálidas como páginas de um livro<br />
Têm cabelos e pelos escuros<br />
Pretos como a palavra impressa<br />
<br />
As minhas musas não envelhecem<br />
O tempo só as consagra<br />
No âmbar de folhas guardadas<br />
<br />
As minhas musas são cortesãs<br />
Desarranjadas<br />
Na realeza de uma estante<br />
<br />
Mas basta um instante<br />
Um perpassar de olhos por suas lombadas<br />
Que a volúpia incontida<br />
Na ereção do pensamento<br />
Faz-se catarse de momento<br />
E alguma há de ser relida<br /><br />Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-90573557127673608002013-08-01T17:35:00.000-03:002015-01-01T13:51:28.035-02:00A Máquina de Fazer Gelo<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://3.bp.blogspot.com/-Al1vlDa0nZM/VKVs8uQjvqI/AAAAAAAAA5Y/p4F3EgeSMmE/s1600/fabricagelo.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://3.bp.blogspot.com/-Al1vlDa0nZM/VKVs8uQjvqI/AAAAAAAAA5Y/p4F3EgeSMmE/s400/fabricagelo.JPG" /></a></div><br><br>
<p>O pescador tirou o barco. E a rede. E o peixe.</p>
<p>O peixe vendeu. O peixe sobrou. O peixe perdeu.</p>
<p>O governo interveio. E veio. A máquina – fabulosa máquina de fazer gelo.</p>
<p>O pescador sorriu. Era imensa a máquina. Parecia-se com a caixa-forte do Tio Patinhas.</p>
<p>O pescador, maravilhado, viu a máquina despejar montanhas de lascas de gelo.</p>
<p>O pescador se conteve. Quereria mergulhar naquelas lascas, uma fortuna em moedas de gelo.</p>
<p>Mas o gelo era frio. Era molhado e escorregadio. Era mais duro que moedas, e afiado de cortar a alma.</p>
<p>O pescador partiu. Tirou o peixe, a rede, o barco.</p>
<p>As moedas derreteram. Sumiram pela fresta das areias.</p>
<p>O pescador vendeu.</p>
<p>Sobrou.</p>
<p>Perdeu.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-43811671932697116772013-06-07T15:01:00.000-03:002014-09-29T04:50:12.991-03:00Feito Moça<a href="http://2.bp.blogspot.com/-U8qvDWszfag/UbdrLb1DOoI/AAAAAAAAAgM/QUSE7FxJ2IA/s1600/milk.jpg" imageanchor="1" ><img border="0" src="http://2.bp.blogspot.com/-U8qvDWszfag/UbdrLb1DOoI/AAAAAAAAAgM/QUSE7FxJ2IA/s320/milk.jpg" /></a>
<p>É tarde, e o leite irreversivelmente derramado. Talvez seja o tempo de condensar as doces amarguras numa prateada lata de lembranças.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-81131022827588985242013-03-25T16:53:00.000-03:002014-09-29T04:57:58.060-03:00Buraco Negro<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://1.bp.blogspot.com/-FhU9cpElpSI/UbdjDurTBII/AAAAAAAAAf8/Z3TrhC_46lc/s1600/radiation.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="299" width="499"src="http://1.bp.blogspot.com/-FhU9cpElpSI/UbdjDurTBII/AAAAAAAAAf8/Z3TrhC_46lc/s320/radiation.jpg" /></a></div>
<p>Inseriram ogivas nucleares nos meus poros. Sinto eclodirem Hiroshimas e Nagasakis por toda a extensão do território corporal. A genética do pensamento sofre, a cada instante, mutações disformes, que são rechaçadas numa compreensível repulsa. Não sou mais humano. Nem desumano. Perdi a noção de humanidade.</p>
<p>A torrente ácida lava meus neurônios como se fossem grãos de açúcar refinado. O cianeto invade e se aloja nos alvéolos. Respiro com dificuldade; transpiro em abundância. A grama se parece com estalactites e perfura o meu couro cabeludo. O mar avança acima da linha do horizonte e espalha nuvens de espuma. Uma esquadrilha de moscas pousa nas crateras das minhas feridas.</p>
<p>Vejo homens pretos, de cabeças amarelas. Possuem corações amarelos, com estáticas válvulas pretas. Ensacam-me e me lacram. Tudo, agora, é uma silente escuridão.</p><br>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-82941094508158550122013-01-19T10:39:00.000-02:002014-09-29T05:12:29.299-03:00Injusta Causa(um cordel agauchado)</br></br>
Quem vem lá do Pinhal</br>
Em direção à Cidreira</br>
Pela Reta desigual</br>
Na altura da madeireira</br>
Mais três quadras avance</br>
E dobre na Casa dos Monstros</br>
Até que o Mar alcance</br>
Ali é via de encontros</br>
Do veranista e do morador</br>
Da moça dourada e do ambulante</br>
Do violeiro, do pescador</br>
E do gaudério itinerante</br></br>
Foi lá que se deu o fato</br>
O terrível incidente</br>
Alguém pagou o pato</br>
Por denúncia improcedente</br>
Quem não doma seu ato</br>
Afeta o meio-ambiente</br></br>
Veio polícia, autoridade</br>
Trator e caminhão</br>
Sem a menor piedade</br>
Pelaram todo o chão</br>
Dane-se a Comunidade</br>
Que recupera tudo em vão</br></br>
Arranca toco, paliçada</br>
Bandeirola, demarcação</br>
Feitos com Arte abençoada</br>
Paciência e dedicação</br>
Por um Homem que é exemplo</br>
Na faina da Preservação</br>
Das areias fez seu Templo</br>
Manejando o Cordão</br>
Sem cargo e sem salário</br>
E sem gastar um tostão</br></br>
É nessas horas que penso:</br>
Pra quê Governo, minha gente?</br>
Pois o valo corre intenso</br>
Poluindo o Ambiente</br>
Neste valor invertido</br>
A Língua é que morde o dente</br>
O Lobo travestido</br>
É o principal poluente</br></br>
Mas lá no Palácio das Plumas</br>
Dos paetês e dos vidrilhos</br>
Pouco se importam com as dunas</br>
Com tuco-tucos ou sarilhos</br>
Bastou um canetaço</br>
Daquele importante agente</br>
Que a Praia virou um bagaço</br>
E o tal nem se fez presente</br></br>
Seu Luiz, que não é Santo</br>
Mas fez um pequeno milagre</br>
Uma coisa eu garanto</br>
Honra o Vinho, despreza vinagre</br>
De Tenaz incansável</br>
Faz História este vivente</br>
E para registro inefável</br>
Assino este verso imprudente</br></br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-83710781829505144462012-11-28T16:27:00.000-02:002014-09-29T05:16:30.870-03:00Policromias Nada Psicodélicas<p>Trinta e dois graus centígrados. Invejei a ereção do termômetro, que continuava em plena ascensão. Ela acabara de me colocar na galeria da suspeição. Neguei. Todo culpado nega. Então, eu seria uma aberração, um pansexual? Neguei e continuei: "– Sai fora, isso é coisa do Sergei!". Querendo atenuar minha pena, propus assumir em parte. Ou partes. E parti, sem apartes, para a assunção de uma certa polissexualidade. A desconfiança, inculcada com malícia, fazia com que eu me enrolasse nos próprios argumentos: "– Mas não posso sê-lo como autor, como personagem?". "Sei não..." – e desligou.</p>
<p>Rememorei a proporção dos vídeos, dois policiais para um caubói. Revi a cena. Entrei na locadora – que, a esta altura, já luzia como loucad'oro – e caminhei até o balcão. Pedi sugestões e contra-ataquei com o Rainer. De bermudas, chinelos, cabelos e barbas abundantes, desgrenhados, e as unhas extremamente compridas. Na minha ótica, um lobisomem.</p>
<p>Refiz a personagem. Colori, ajustei e estampei as bermudas. Coloquei uma pérola em cada chinelo. Por cima dos ombros, escorreria um bolerinho, de tecido bem fino, realce aos mamilos. Retirei totalmente a barba, deixando ralas suiças. Ao pescoço, um lencinho de seda, torcidinho para o lado. As unhas mantive.</p>
<p>Refiz a cena. Desci da bicicleta, arqueando o dorso para empinar o rabo. Um rabo redondo, injetado na minha murcha bunda. Cuidei para que os pés pisassem com suavidade em linha reta. Ao final do desfile, balbuciaria, com intencional languidez: "– É hoje que levo meu Fass!".</p>
<p>– Que "faz"?</p>
<p>– O Binder, bofe.</p>
<p>– Ah...</p>
<p>O termômetro recuou dois graus. O suficiente para que eu descesse, rapidamente, todos os sete degraus da arcoírica escada dos meus devaneios.</p>
<p>Ela: este final ficou muito <i>gay</i>.</p>
<p>E eu não sei?</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7393409114609178483.post-57508845100825069992012-11-14T16:22:00.000-02:002014-09-29T05:18:21.527-03:00Na Terra do "Não-Dá-Nada"<p>O pai de uma vítima de homicídio adentra as dependências da polícia judiciária. Munido de arma branca, desfere estocadas no suposto autor do crime. Este não resiste aos ferimentos e morre. Concomitantemente, um juiz está prestes a decretar prisão domiciliar para mais de setecentos apenados que possuem, por força de Lei, direito à progressão penal. Tal se dará – justifica o magistrado – por não haver estabelecimentos que acolham estes detentos sob regime semi-aberto. Os fatos, em si, são isolados e pontuais, mas corroboram com a linha de pensamento que insiste e persiste.</p>
<p>A violência urbana não é prerrogativa de países terceiro-mundistas. Como não se lembrar dos atos de vandalismo que assolaram Paris? Ou do gás Sarin, no Japão? Ou, ainda, daqueles súditos, que exaltam a barbárie de suas origens, quando frequentam as arquibancadas de um campo de futebol, conspurcando os brios e abalando a aparente serenidade de uma realeza britânica?</p>
<p>Todos sabemos que, em qualquer parte do Mundo, penitenciárias não são, nunca foram e jamais serão instituições reintegradoras. Seu papel é meramente punitivo, mesmo que apliquem programas e adotem medidas sócio-educativos. A parcela de adeptos é mínima, condizente com a índole dos indivíduos que deles se beneficiem. Por outro viés, nos deparamos com o estatuto mais esdrúxulo que se poderia esperar dos nossos legisladores: o prêmio por bom comportamento. Ora – me pergunto –, mas não seria isto o mínimo que se poderia esperar por obrigação de um condenado? Parece-me que aí ocorre uma inversão de valores. Não seria justo, em caso de transgressão, aplicar uma majoração na pena daqueles que mal se portam? De que vale, então, essa tal de dosimetria?</p>
<p>A Constituição brasileira nos assegura o direito à vida. A ausência de diploma legal que disponha sobre pena capital, é, sob esta ótica, coerente, se assim se pode dizer. No entanto, nós, ditos cidadãos do bem, é que colhemos, diariamente, as terríveis impressões daqueles que trilham o inapelável corredor que abrevia a existência.</p>
<p>Eu poderia ter me reservado o direito de me calar, feito do parágrafo anterior o ponto final, o crucial do meu protesto. Daquilo que julgo plausível, neste parco arrazoado. Mas, como declarei no início, há uma persistência a ser deglutida, mitigada. As organizações criminosas cobram, entre seus pares, a vida de dois policiais para cada meliante abatido. Vejo, por detrás da fragilidade das leis, os seus mequetrefes autores. À frente de inócuas políticas, corruptos e corruptores. Bem, sou bom atirador. Sei ajustar perfeitamente a massa de mira em relação à alça, em fuzil de longo alcance. E já que não dá nada...</p><br>Unknownnoreply@blogger.com0