Trinta e dois graus centígrados. Invejei a ereção do termômetro, que continuava em plena ascensão. Ela acabara de me colocar na galeria da suspeição. Neguei. Todo culpado nega. Então, eu seria uma aberração, um pansexual? Neguei e continuei: "– Sai fora, isso é coisa do Sergei!". Querendo atenuar minha pena, propus assumir em parte. Ou partes. E parti, sem apartes, para a assunção de uma certa polissexualidade. A desconfiança, inculcada com malícia, fazia com que eu me enrolasse nos próprios argumentos: "– Mas não posso sê-lo como autor, como personagem?". "Sei não..." – e desligou.
Rememorei a proporção dos vídeos, dois policiais para um caubói. Revi a cena. Entrei na locadora – que, a esta altura, já luzia como loucad'oro – e caminhei até o balcão. Pedi sugestões e contra-ataquei com o Rainer. De bermudas, chinelos, cabelos e barbas abundantes, desgrenhados, e as unhas extremamente compridas. Na minha ótica, um lobisomem.
Refiz a personagem. Colori, ajustei e estampei as bermudas. Coloquei uma pérola em cada chinelo. Por cima dos ombros, escorreria um bolerinho, de tecido bem fino, realce aos mamilos. Retirei totalmente a barba, deixando ralas suiças. Ao pescoço, um lencinho de seda, torcidinho para o lado. As unhas mantive.
Refiz a cena. Desci da bicicleta, arqueando o dorso para empinar o rabo. Um rabo redondo, injetado na minha murcha bunda. Cuidei para que os pés pisassem com suavidade em linha reta. Ao final do desfile, balbuciaria, com intencional languidez: "– É hoje que levo meu Fass!".
– Que "faz"?
– O Binder, bofe.
– Ah...
O termômetro recuou dois graus. O suficiente para que eu descesse, rapidamente, todos os sete degraus da arcoírica escada dos meus devaneios.
Ela: este final ficou muito gay.
E eu não sei?
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